quarta-feira, janeiro 3

Para quem não percebeu o post anterior...

Tendo em conta que gerou alguma polémica o meu post anterior, gostaria de o explicar de uma forma mais explícita e construtiva!

Parece-me óbvio que o meu comentário anterior é infantil, idiota, intelectualmente deprimente mas, acima de tudo, irónico e até mesmo humorístico; todos estes adjectivos (tal como qualquer adjectivo) são alvo de apreciações de diferentes qualidades conforme a sensibilidade de cada um! Porém, reafirmo, era sobretudo uma ideia irónica e humorística! E foi pensada dessa maneira... eu, enquanto ser pensante, não obedecendo a nenhuma hierarquia ou doutrina política ou religiosa restrita e rígida, tenho a feliz liberdade de exercer esta minha liberdade criativa sem que isso afecte muito gravemente quem quer que seja. Aliás, um espaço como este, um blog, subscreve essa prática, essa filosofia, essa permissão! Posso, por isso, cometer os meus exageros, os meus delírios literários, apesar de não ser esse o meu forte ou minha ambição. Porque, repito, no meio do nosso tecido social, cultural, científico ou religioso sou, rigorosamente e literalmente, um grão de areia no meio do infinito!

Mas gostaria de exprimir o seguinte: vivemos uma época da História da Humanidade que poderia ser descrita como a época do pormenor, da subtileza verbal! Uma palavra, uma ideia, um gesto desmedido pode originar uma guerra, um desentendimento grave, um conflito de várias ordens. E, se tal for cometido por alguém de grande relevância para a História da nossa Humanidade, maiores e mais catastrofistas serão esses efeitos. O Papa Bento XVI, ao apelidar de terroristas todos aqueles que defendem a IVG, está a trilhar um caminho perigoso, danoso para as caixas de Pandora que a própria Igreja tem e vem contribuir muito destrutivamente para a já muita alterada sanidade emocional que um debate desta natureza deveria ter! Porque o Papa diz que eu sou Bin Laden, porque o Papa vem ostracizar cidadãos de todos as faixas sociais, credos, cores, ideologias, inteligências, profissões e pessoas que também se encontram na sua Igreja. Mas, no que diz respeito a ostracizações por parte da Igreja, a mesma sabe o que faz, como faz e com quem faz (ao longo dos Tempos). O que é grave é o Sacerdote mais elevado da Igreja Católica colocar-me no mesmo cesto que Bin Laden, Hitler, Estaline (facto meramente interessante: estes 2 últimos senhores era também ferozes partidários do "Pró-Vida", criminalizando o aborto quando chegaram ao poder, mas é mesquinho e estúpido usar isso como argumento!). É um abuso de autoridade, de verbalização, de consciência e muita desonestidade intelectual e emocional; enquanto cidadão não lhe reconheço legitimidade para me qualificar dessa maneira! E, no fundo, vem apenas acentuar uma característica nefasta para estes debates: a impossibilidade de construír-se um diálogo contrutivo, aberto, frontal mas, sobretudo, que seja respeitador das opiniões, valores e sentimentos de todos aqueles que estão de um lado e do outro desta questão! E isso tem faltado bastante: respeito e "des-emocionalizar" esta questão! Bento XVI já provou, noutras situações, que não tem a mínima sensibilidade política/comunicacional e isso pode custar muito caro à Igreja!

A própria Igreja, que se diz defensora da vida, que posição tem em relação ao uso do preservativo como força de prevenção e preservação dessa mesma vida? E o que tem dito (e impedido!) sobre a questão da educação sexual? Não quero com isto dizer que a Igreja não possa formular a sua opinião sobre a questão da IVG (reconheço o papels estimável que teve e tem para a cultura e sociedade contemporânea!), mas rejeito a posição de supra-moralista que afirma ter em todos este debate, porque o navio da Igreja tem vários buracos e ainda não se apercebeu que há já muito tempo que se está a afundar...

Mas gostava também de dirigir outras perguntas e não apenas à Igreja; também aos políticos, porque esta também é uma questão política; também à sociedade civil e a todas as organizações que se juntam, como forças militares para uma guerra, para esta discussão... acordaram todos agora?? Eu não preciso de lembrar as estatísticas do aborto, eu não preciso de mencionar, de novo, a tragédia pictórica, psicológica e física que representa o aborto para a mulher e para a criança! Não preciso, porque somos soterrados com esses números, com imagens chocantes, com ideias perturbantes, de um lado e do outro da barricada! Parem de encher os mails das pessoas com isso, porque nada disso muda o cenário actual que o nosso país tristemente tem e que, independentemente do resultado do dia 11 de Fevereiro, não saberemos se irá alterar-se!

Por isso, mais do que saber o que se vai legislar, pergunto o que sugerem, o que acham que já se podia ter feito e não se fez! E, se não se fez, porquê e quem são os culpados (morre solteira, morre solteira!)! Façamos, todos, um exame de consciência sobre o que não fizemos e deveríamos ter feito!
Onde estão os ferozes planos de planeamento familiar, onde está a formação cultural, cívica e sexual da nossa sociedade para a questão da família e do aborto? Há quanto tempo é que se (não!) faz? Onde está o investimento cívico e onde estão, hoje, aqueles que já o poderia mter feito no passado?
Porque é preciso não esquecer, é preciso relembrar que muitos daqueles que hoje dizem "Não" foram aqueles que já tiveram no poder e que podiam colocar em prática o que defendem agora para derrubar o "Sim": apostar na educação, na formação, nas iniciativas cívicas como forma de prevenção! Mas porque é que não o fizeram?? Porque raio é que mais de 30 anos após o 25 de Abril e sempre a sermos governados praticamente pelos mesmo partidos que apontaram sempre as mesmas metodologias e políticas para a questão da IVG nunca se propuseram a fazer, a ocorrer, a concretizar todos os magníficos planos de educação e prevenção sexual?
Então vêm agora apontar como plano soberbo algo que os póprios não fizeram quando tinham essa possibilidade? Que tipo de moral ou honestidade é essa?

O resultado é que, hoje, 2007, ainda não sabemos como fazer; o problema é que hoje, em 2007, há algumas pessoas que dizem: "bom, há mais de 30 anos que este sistema não funciona, vamos alterar para ver se algo acontece" e são logo apelidadas de criminosas dos tempos modernos, indignas da condição humana! Porque não somos capazes de aceitar que ninguém tem legitimidade e certeza plena sobre o que é a Vida ou a Morte! Porque ninguém tem humildade suficiente para dizer que não há (apenas) moralistas e assassinos nesta disputa... porque há quem pense que há muito tempo que tentamos abrir uma porta com uma chave que entra mas não roda... mas não deixam testar outras chaves! Talvez não entrem, talvez não rodem... mas deixem tentar outras chaves! Não quer dizer que a minha chave é melhor, quero apenas tentar abrir a porta, o desejo de todos nós!

Sem bombas, sem ameaças, sem dramas, sem rótulos! Porque enquanto continuarmos a pensar que eu detenho a razão toda e que nada sobra da mesma para quem pensa (ou sente!) diferente de mim, então eis a prova inequívoca da puberdade e imaturidade da Humanidade (ou da nossa sociedade portuguesa!) e que todos nós atravessamos mais uma dor de crescimento... ainda nos falta tanto para sermos "grandes"!!!

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